QUE TAL UM BRIGADEIRO?

COLUNA PRATO FEITO

POR NÊMESIS PARESCHI

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Ela o conheceu numa balada. Ele estava lindo. Olhos azuis, cabelo jogado para o lado, corpo modelado na academia e ar de mistério.  Ela, de vestido verde esmeralda, salto alto dourado e tímida como sempre ficava em situações de possíveis flertes.

Ele se aproximou, puxou assunto sobre a qualidade das músicas e lhe ofereceu uma bebida – Água, por favor, desculpe mas não costumo beber nada alcoólico, é calórico. Duas águas geladas, então, ele pediu no bar e foram para o mezanino conversar. Horas depois, números de telefone trocados e é melhor ir embora, afinal, amanhã ainda é sexta-feira e preciso trabalhar.

No dia seguinte, no caminho do trabalho ela finalmente percebe que a realidade está de volta. Nenhuma mensagem dele no celular, mas quem sabe mais tarde, não é? Dá bom dia para quem passa, já que conhece praticamente todo mundo do bairro fazendo o mesmo trajeto por anos, e eis seu maior obstáculo diário: o carrinho de brigadeiros. Bom dia, moça! Está bonita como sempre! Que tal um brigadeiro? Vai um brigadeirinho hoje? Tem tradicional, de coco, de amendoim, de morango… E ela solta um bom dia desesperado e sai correndo. Apesar da simpatia do vendedor, do fato de ele sempre tentar puxar assunto e da maravilhosa vitrine, ali está seu maior problema diário: a luta contra a balança.

O dia vai correndo e nada do celular mostrar novas notificações. A ansiedade, velha companheira, resolve visitar e trazer todas as malas possíveis, e comer algo doce se torna quase incontrolável, mas é preciso respirar fundo e resistir, não posso descuidar.

Fim do expediente, hora de correr pela cidade para aliviar o estresse e queimar algumas calorias. Fone de ouvido, ok. Garrafa de água, ok. Celular, nada ainda dele, mas ok.

Morar num bairro movimentado é ótimo! Pessoas caminhando e conversando pelas calçadas a qualquer momento do dia e da noite, o comércio está sempre aberto e opções de lojas não faltam. Hmmm… Reconheço esse cheiro! Churrasco, picanha, acompanha bem farofa e pão de alho com salada à campanha, mas já comi minha omelete de claras com agrião. Foco na corrida. Padaria… broa de milho, pão fresquinho, sinto cheiro de sonho recém preparado. Preciso correr mais rápido. Boa noite, moça! Que tal um brigadeiro? De manhã você não quis, mas e agora de sobremesa pro jantar? E o celular toca. Alô? Lembro de você sim, claro! Jantar amanhã? Pode ser sim. Combinado, às 20 horas. E dessa vez ela corre de alegria para casa para escolher um vestido.

Há quem diga que a paixão tira a fome da gente e, de fato, resistir às tentações nunca fora tão fácil. Nunca mais nem olhara para a vitrine de brigadeiros, o que parecia deixar o vendedor um tanto desapontado. Porém, jantares, almoços e cafés da manhã depois, eles começam a namorar e ela se sente a mulher mais incrível do mundo. Ansiedade sob controle, ele é ótimo em todos os aspectos e ela nunca sentira tanta vontade de se cuidar na vida, auto-estima além do universo! E aí, em uma de suas corridas noturnas num dia em que ele teria uma reunião, ela vê o carro dele – Uma surpresa pra mim? Que máximo! – Tum, tum, no vidro e ele se abaixa. Oi… quem é essa mulher? E o que o batom dela faz na sua camisa?  – Ela é… uma amiga… do trabalho… – E o mundo desaba. – Ok, então pode ficar com a sua amiga do trabalho. Você não tem mais namorada. Ela corre tão rápido quanto as lágrimas em seu rosto.

O vendedor de brigadeiros está lá, naquela esquina vendo de longe o ocorrido. Moça, espera, espera! Se você não quiser um brigadeiro, aceita um copo d’água, senta um pouco, se acalma. E pela primeira vez em anos passando por ali, ela se senta na calçada ao lado dele e começam a conversar. Um copo d’água se torna dois e alguns brigadeiros. Ele, apesar de jovem como ela, já havia vivido o que ela acabara de passar e compartilharam as experiências de vida. Lindos olhos castanhos ele tem, e sabe cozinhar muito bem, eu nunca comi nada tão bom como esses brigadeiros. E ela vai embora sem pagar apesar de discutirem sobre isso. Não, não, levei anos para saber apenas o seu nome e hoje que descobri, fica como se fosse o valor dos brigadeiros.

No dia seguinte, e no outro, e no outro, ela sempre parava ali para conversar e, às vezes, comer um brigadeiro e aquele amigo foi trazendo alegria nova para sua vida, adoçando os seus dias. Tenho uma proposta pra você: tenho uma encomenda de 1000 brigadeiros para domingo, quer me ajudar? Te ensino a decorar e a enrolar cada sabor. Moro aqui perto. Então, te espero sábado às 10 horas da manhã pra começarmos a trabalhar.

Ele não parava de cozinhar as coisas mais gostosas que ela comera e aquele final de semana fora o primeiro em muito tempo em que ela esqueceu da balança e de todos os medos com a comida – Posso falar uma coisa? Te acho muito bonita, sempre achei, não me leva à mal, mas gostaria de sair com você, você me daria uma chance?

E meses depois, eles não precisaram pagar pelo buffet ou docinhos do casamento. Eles mesmos prepararam juntos, agora, em sua própria empresa de eventos. Às vezes, aquilo ao que mais se resiste é o que pode mudar a sua vida. Nunca valeu tanto a pena comer um brigadeiro!

Que tal um brigadeiro?