RELAÇÕES POUCO ECOLÓGICAS – CATIA MELO

O estudo da vida. Este é o significado da palavra Biologia. Mas definir vida pode ser algo muito mais complexo. Segundo os cientistas, define-se ser vivo aquele organismo que apresenta uma série de características como metabolismo, organização, capacidade de reprodução, entre outras. Além de diferentes aspectos, as relações destes organismos com o ambiente também são objeto de estudo. Do micro ao macro, de uma bactéria invisível sem o microscópio a uma baleia azul de 25 metros de comprimento, de culturas de células a mapeamentos ambientais, de extração de proteínas a estudos de imensas teias alimentares oceânicas, conhecer os seres vivos, seus componentes e suas relações com o meio auxilia nossa vida de diferentes formas. Desde a compreensão de patologias até curiosidades de eventos e de organismos inusitados, contribuindo especialmente na melhoria de nossa qualidade de vida de forma direta ou indireta, já que somos seres vivos e interagimos como tal.  Porém, como para tudo na vida – e com a Biologia não seria diferente – existem os vilões, tudo aquilo que pode prejudicar o avanço ou a divulgação de achados biológicos.

Discutiremos a seguir a participação destes vilões e como eles podem influenciar o desenvolvimento da nobre arte de compreender a vida.

Pseudocientistas

Provavelmente nos últimos meses, em tempos de uma nova epidemia de febre amarela, você deve ter recebido inúmeras mensagens, textos e relatos sobre a doença ressaltando informações falsas. Com entonação de seriedade, ouvimos que a vacina era uma fraude, que era uma doença nova ou ainda que os macacos eram os transmissores. Sem dúvida, a divulgação de informações erradas e a falta de critério de seus leitores, têm prejudicado muito no esclarecimento das pessoas acerca de diferentes assuntos, não só no que compete a Biologia. Vale ressaltar a importância de ser crítico no recebimento de mensagens e de verificar a confiabilidade da fonte, para que você também não contribua com esse desserviço social. As informações realmente confiáveis são construídas com base no método científico, que envolve observação, construção de uma hipótese, realização de experimentos para finalmente considerar a hipótese válida ou não. Assim, o pseudocientista não se utiliza do método científico, baseando-se na confiança da informação sem análise, sem crítica de outros especialistas, geralmente com base vaga e sem profundidade. Vemos exemplos diários de pessoas que defendem o consumo de determinados alimentos milagrosos para a sua saúde, mas que sequer passaram perto de uma graduação em Nutrição. Muitos que atuam como coaching em diferentes áreas, sobretudo no desenvolvimento pessoal, sem conhecimento básico de Psicologia. Orientadores em atividade física sem terem o curso de Educação Física na bagagem. Não critico o uso de blogs, de canais no YouTube, de diferentes formas de comunicação e de prestação de serviços. Tudo isso é válido, desde que respeitando o conhecimento em sua essência e o indivíduo que fará uso desta informação.

Fanatismo

Outro vilão é o fanatismo. O fanatismo nunca é benéfico, independente do que esteja sendo defendido, seja um time de futebol, um partido político, uma doutrina religiosa, um ponto de vista, ou o que quer que seja. Sempre que ele está presente, a irracionalidade também se encontra, bem como a falta de diálogo e de compreensão, gerando muitas vezes episódios desastrosos, inclusive na Biologia, onde o aspecto mais triste de fanatismo envolve a religião. Não critico nem defendo nenhuma religião ou religioso. Cada um é livre para interpretar e defender suas próprias verdades e, com respeito, religião e ciência podem coexistir, produzindo diálogos saudáveis. Existem pesquisas científicas bastante sérias envolvendo religião, assim como religiosos defendendo aspectos científicos. Certa vez, Papa Francisco afirmou em um de seus discursos que as teorias do Big Bang e de evolução de Darwin não contradizem o cristianismo. Minha crítica não é em relação a estas interações, mas sim ao fanatismo. Ninguém é obrigado a gostar de ciência ou de religião, mas o respeito se faz necessário. Quando um leigo entende que não se pode falar sobre evolução em uma sala de aula porque isso é contra um dogma religioso, não há um diálogo. Todos devem ter o direito e o acesso sobre o que os verdadeiros cientistas já publicaram em seus trabalhos. Como cada um vai receber ou interpretar essa informação é a percepção de cada indivíduo, mas a proibição do acesso à informação é prejudicial individualmente e socialmente.

Indiferença

Dos grandes vilões aqui relacionados este é, para mim, o mais assustador. É aquele sujeito que tem acesso à informação, pode ser um conhecedor do assunto e opta por não se envolver, afinal isso não é problema dele. Especialmente no que diz respeito à Ecologia, isso infelizmente é muito comum. É conhecer sobre aquecimento global, sobre poluição em diferentes níveis, sobre a produção excessiva de resíduos e, ainda assim, não separar o seu lixo reciclável, não fazer escolhas mais sustentáveis e jogar aquele papelzinho no chão, quando ninguém está olhando. É aquele discurso horrível de “ninguém faz, por que eu vou fazer?”. A indiferença é, em última análise, um desafio em diferentes áreas e que, fatalmente, nos compromete em diversos níveis. A falta de empatia é muitas vezes uma das grandes responsáveis pelos grandes males da sociedade. Mais especificamente em Biologia, isso prejudica muito os trabalhos de Educação Ambiental, por exemplo, onde é importante o “fazer a minha parte” por menor que ela seja. Uma garrafa pet a menos no lixo orgânico ou uma árvore a mais no parque faz sim a diferença para mim e para outros seres vivos também.

Para que a ciência e mais especificamente a Biologia possa influenciar de maneira ainda mais benéfica em nosso dia a dia basta que sejamos mais criteriosos, mais respeitosos e empáticos. Somos apenas uma espécie no planeta, interagindo com inúmeras outras. Compreender melhor a dinâmica destas interações e como podemos contribuir para que elas continuem a acontecer trará muitos benefícios a nós mesmos.


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Catia Melo
tem 36 anos, é de Santo André e é bacharel e licenciada em Ciências Biológicas, mestre em Neurociência e Cognição, especialista em Educação Especial e Inclusiva e em Libras – Língua Brasileira de Sinais.