“Nunca nada grandioso no mundo foi feito sem uma grande dose de paixão.”
Isso já dizia Georg Wilhelm Friedrich Hegel, um filósofo alemão de nome complicado, então, ele deve estar certo. Não só pelo nome complicado, claro, mas porque, sinceramente o que de bem feito tem no mundo que não foi feito com afinco e dedicação? A paixão por algo vai definir quanto empenho você coloca na tarefa que tem em mãos, determinando o grau de afinco que vai colocar em alguma coisa.
Na literatura temos diversos casos de personagens apaixonados, e não exatamente por outras pessoas. Alguns personagens costumam ser tão focados com alguma coisa que essa paixão específica atrapalha sua vida amorosa, ou pauta suas demais relações. Por exemplo, Harlan Coben escreveu dois personagens cujas paixões ditaram o rumo de suas vidas, Myron Bolitar e seu fiel amigo Win passaram por várias etapas de suas vidas dançando ao redor de diversos mistérios, sendo que sempre mantinham um denominador comum: amizade e basquete. Parece um clichê comum, homens e seus esportes, mas, no caso de Myron, como poderão ver brevemente, o basquete determinou todos os passos na vida dele, sendo um fator presente em cada livro, de uma maneira ou de outra.
O universo literário é cheio de personagens cujas paixões são forças destruidoras ou agentes que fomentam a união, no caso de Carlos Ruiz Zanfón, somos apresentados a várias paixões em seus livros, a paixão do autor por Barcelona – aliás, o descaramento pela preferência aqui é quase tão grande quanto o de Mário de Andrade por São Paulo – ou dos Sempere pelos livros. A livraria da família e a proteção dos livros representam uma paixão que passa por gerações na família, unindo os membros com um objetivo em comum.
Paixão também motiva luta e poucas paixões são tão fortes como aquelas originadas em nome do país ou de uma filosofia de vida. Mayombe, do Pepetela é repleto de casos de homens e mulheres apaixonados por uma causa, sedentos de libertação e dispostos a dar a vida por um ideal. As revoluções só acontecem devido a paixão ardente de seus perpetradores, pessoas desmotivadas não fazem revolução. O desejo de sangue ou de justiça também é um tipo de paixão, a dedicação ao sistema judiciário e a firme crença de que ele funciona também é uma paixão, há diversos personagens que acreditam que a lei é o sistema que merece dedicação total, ou que a justiça deve ser tratada como algo precioso e que quando ela falha com você, as coisas devem ser tomadas em suas próprias mãos. E sim, estamos falando sobre obsessões e paixão por justiça em O Segredo de seus olhos, e ainda que eu pessoalmente ame uma paixão usada para o lado ruim, porque, convenhamos os melhores assassinos tem propensão a ter paixão por sangue ou por causar dor aos outros, Hannibal Lecter tem paixões claras, e apesar de seu gosto por comer partes do corpo seja peculiar, a paixão por comida é uma clara indicação de que o livro vai te deixar faminto.
Quem já leu Como água para chocolate, tem por obrigação ter passado um bom tempo refletindo sobre fazer as receitas, a paixão pela comida e pela arte de cozinhar é algo especialmente encantador nessa obra. O ponto é que a paixão do personagem nos contagia, e embora não saiamos matando com requintes de crueldade porque a morte é a paixão do vilão, apreciamos ser envolvidos de tal modo que as preferências do personagem nos ajudem a entendê-lo. Vamos falar sobre o que nos torna motivados e inspirados, vamos falar sobre paixão.
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Leticia Silva Santos (@laetitiasjc) é professora não praticante, formada em Letras, pela Universidade de Coimbra, devido ao seu imenso amor à literatura. Possui uma coleção de livros que nunca será grande o suficiente.