Não tenho reparos em dizer o quanto gosto do Lula. Podem pensar o que quiserem, mas o meu afeto vai além de qualquer contradição ideológica. Quero explicar meus motivos.
Nesse final de semana precisei viajar para Santiago, na capital, e aproveitei para encontrar alguns amigos. Não nos víamos há anos, então parecia ser uma boa oportunidade.
Fomos para casa de um deles e preparamos coisinhas para comer e beber. Em poucos minutos, já estávamos chorando de rir. Estávamos ansiosos por contar as nossas histórias dos últimos anos, misturadas com lembranças das bobagens que a gente fazia na época da faculdade. Eu me sentia tão familiar, algo que há tempos não imaginava que seria possível. Meus amigos achavam graça do meu novo jeito de menina do interior. Apesar de não me sentir pertencente à lugar nenhum, naquele momento me senti em casa.
Na época da nossa juventude éramos tão ingênuos. Saímos dos nossos interiores, das nossas periferias e fomos morar em outro país, sem saber ao certo como seria. Lá encontramos a liberdade em doses exageradas, tanto que não sabíamos o que fazer com ela. Hoje, as demandas da vida adulta nos colocam em xeque o tempo todo. Não sei se somos mais aqueles meninos que queriam mudar o mundo, porque há contas a pagar, crianças e pais idosos para cuidar. E esse mundo não perdoa.
Já era passado da meia-noite e tínhamos bebido uma quantidade considerável de vinho. Um deles propôs abrir mais um, aquele especial que tinha comprado numa viagem na Espanha. Todo mundo achou que valia a pena por motivo desta ocasião tão especial.
Só consigo lembrar do aroma forte de ameixa e do jeito que meu estômago ficou revirado a noite toda. Eu já estava dando sinais de que iria passar mal, então um deles preparou uma cama bem fofinha para mim.
Para surpresa de ninguém, passei mal a noite inteira e no dia seguinte estava só os cacos. Devo ter dormido umas vinte e quatro horas seguidas, porque lá para as oito da noite, ouvi uma voz terna dizendo: Acorde, meu bem. Preparamos sopinha para você.
Onde já se viu amor maior?
Ser cuidada sem culpas nem cobranças deve ser uma das demonstrações de afeto mais importantes que já senti. Pode soar bobo, mas só quem já esteve junto em todos os seus corres vai saber cuidar bem da sua ressaca.
Nessa sopinha estavam contidas todas as nossas histórias de ressacas antigas com vinhos baratos, noites longas de estudo ou de farra. Isso tudo graças a quem criou a nossa faculdade dez anos atrás: Luiz Inácio Lula da Silva.
Eu amo o Lula, porque nesse gesto grandioso de criar universidades, ele propiciou os encontros mais marcantes na vida de tantos jovens como eu.
Graças ao Lula conheci os amores da minha vida: Meus amigos.
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Valentina Bascur Molina é pesquisadora, poeta, escritora e tradutora. Mestre em Estudos Feministas pela UFBA. Nasceu e cresceu em Temuco, território de Wallmapu, Chile. Reside no Brasil há nove anos. Autora de “Kümedungun: trajetórias de vida e a escrita de si de mulheres poetas Mapuche”, publicado pela Editora Urutau, selo Margem da Palavra, em 2021. Integra o Núcleo Feminista de Dramaturgia, espaço em que desenvolve projetos de escrita e pesquisa coletiva com outras autoras, sob orientação de Maria Giulia Pinheiro.