Coluna | Precisão
Perdi o último ônibus porque fiquei combinando com o pessoal da faculdade os detalhes do trabalho de Estatística. Faltavam vinte para a meia-noite. A solução era caminhar. Na segunda quadra começou a chover, ajoelhei na calçada e abri a mochila para pegar um casaco em meio aos livros.
Minha cara bateu no chão quando ele me chutou. Perdi dois dentes. O sangue desceu no meu pescoço e ensopou minha camiseta. Fui algemado e jogado na viatura. Não responderam minhas perguntas. Não se incomodaram com meu espanto.
De manhã fui liberado, cheio de dor e sangue seco no corpo. Antes de sair da delegacia ouvi os dois policiais tomando café e explicando a situação aos colegas – Estava escuro e a gente procurava um neguinho.
Nenhum deles me pediu desculpas.
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Alê Motta nasceu em São Fidélis, interior do estado do Rio de Janeiro. É arquiteta formada pela UFRJ. Participou da antologia 14 novos autores brasileiros, organizada pela escritora Adriana Lisboa. É autora de Interrompidos (Editora Reformatório, 2017) e Velhos (Editora Reformatório, 2020).
VÍCIO VELHO 