“Sou tomada por visões feéricas e eróticas”
– Maria Martins
Esses dias tive um sonho em que aparecia um touro. Desses gigantescos. Era preto, típico das touradas espanholas. Ele respirava de forma tão forte e intensa que eu sentia a sua exalação perto de mim. Estava intimidada pela sua presença, mas num ato de coragem inexplicável, dessas coisas que apenas são possíveis em sonhos, fui para cima dele e o mordi no meio do pescoço, bem na veia jugular.
Foi um espetáculo de sangue. O touro ficou se debatendo no chão e eu olhava pro seu corpo com satisfação. Seu sangue na minha boca era um troféu.
Procurei uma pá e fiz uma cova. Não sei de onde veio tanto fôlego e força, mas abri a terra com a convicção de que devia colocar o touro ali dentro ainda vivo.
Depois que o cobri, seu corpo parou de se debater.
O touro era meu futuro. E eu tive que enterrá-lo.
____________________
Valentina Bascur Molina é pesquisadora, poeta, escritora e tradutora. Mestre em Estudos Feministas pela UFBA. Nasceu e cresceu em Temuco, território de Wallmapu, Chile. Reside no Brasil há nove anos. Autora de “Kümedungun: trajetórias de vida e a escrita de si de mulheres poetas Mapuche”, publicado pela Editora Urutau, selo Margem da Palavra, em 2021. Integra o Núcleo Feminista de Dramaturgia, espaço em que desenvolve projetos de escrita e pesquisa coletiva com outras autoras, sob orientação de Maria Giulia Pinheiro.