PEQUENAS PULSAÇÕES POÉTICAS – THÁSSIO FERREIRA

Coluna | Alguma coisa em mim que eu não entendo

o poema (ainda) pulsa. por baixo, por dentro, por trás, por sobre, por nós, por vós, por elas, por tudo. e é preciso que pulse, e que possamos pulsá-lo(s) na plenitude de suas potências. então, após algumas prosas pandêmicas, (im)precisamente para impulsionar nossa pulsão de vida, tão preciosa nestes tempos, compartilho algumas pequenas pulsações poéticas, pelo prazer de poetar (poderoso pão para as lutas e contra as opressões), e possivelmente provocar em nós, nossas sinapses, nossas conexões (ainda que puramente virtuais), um pouco de explosão contra a paralisia, o pessimismo, o pranto. apenas isto: um tanto de poesia parida em espasmos, pescada pelas muitas ”páginas” do pc, porque a poesia possui poderes inimagináveis. mesmo sem compreender, é preciso praticar. espero que seja proveitoso.

# instante-já

quanto dura um poema
na carne sem nunca do tempo?

#
umencantatória
delícia do desejo
é sua bifronte
natureza de lâmina

onde dançamos

# à moda de manoel de barros

a borboleta é uma fragilidade
que avoa

# à moda de manoel de barros II

a morte do passarinho
é quando ele dexiste de cantar

#
o poema:
fagulha
mesmo quando
construída
lapidada
destinada a:
centelha
rubra

#
gosto da chuva:
ela rega meus silêncios
bem no dentro
em branco e vazio
de suas moléculas
inda não nascidas

# (pequena) poesia insuspeita

a poesia insuspeita
toda enorme pequenice
alucinação-surpresa
em se observar
(sem mais nem menos)
uma veia que lateja

#
vêm do fundo de um silêncio azul
as palavras com que a poesia
consolidentifica seus sorrisos
multiletrados e pulsantes
de vozes com voz de mirtilos
em versos de puro ritmo

será?

#
e no entanto
(no enorme entanto
que a vida é)
move-se a vida

#
o vento nunca para
à beira de quem
dentro em si
também (sempre) venta

#
quanto é pouco demais
nos enquantos
que em encanto
vivemos?

#
em tudo
o tempo
deixa marcas

#
sob um céu roxo de nuvens negras
o vento assovia em canto lascivo
os gemidos em eco dos que fodem
à hora fatal dos desavisos

#
um pássaro pousa no colo do telhado
em frente à janela do quarto bem fechado
que a vista cansada do poeta em desmaio
habita sozinha sem medo sem pasmo
da vida que acorda em certos dias de maio

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Thássio Ferreira
, escritor radicado no Rio de Janeiro, é autor de (DES)NU(DO) (Ibis Libris, 2016) e Itinerários (Ed. UFPR, 2018 —  obra vencedora do i Concurso Literário da editoria universitária). Foi editor e curador da Revista Philos de Literatura Neolatina. Tem poemas e contos publicados em revistas e antologias, como Revista Brasileira (nº 94), da Academia Brasileira de LetrasEscamandroGuetoMallarmargensRuído ManifestoGerminaRevista Ponto (SESI-SP), aqui na Vício Velho, InComunidade (Portugal), e outras. Mantém página no Facebook e no Instagram