ABRIL DOS INCLEMENTES – LORRAINE RAMOS ASSIS

|SENHORAS OBSCENAS
Por Lorraine Ramos Assis

festividades sob bocas cheias de insalivação
engolir torna-se tortuoso mediante dias quantificados em memoriais e cremações
a céu aberto

consciência letrada lapidada em um trato digestivo enojado
a cafeteria perpetua o narcisismo perpétuo de distinções
mas o jazigo esquemático não lhe fora perpétuo

a cremação esvoaçante está jazida na estatueta de quintino (você nunca me propôs visitar o bairro homônimo)
outrora um paralelo entre seus exercícios formais
parciais cinzas estremecem durante oito anos no morro do pasmado

os dias aqui e acolá estremecidos por ti foram acoplados em um instituto psiquiátrico, há poucos quilômetros donde tu permaneces
suas pulsões temerárias ressoam em mim

a etimologia não pressupõe a dinâmica da linguagem entre os demais, mas sim dor de lobotomia, que lateja ao redor dos cacos fluídos que jogastes
subornos familiares pós rito funerário são me norteados como a designação que um dos cinco filhos me atribuíram
receios confluem com a instrução que me fora dada há três anos

não há desistência em processos burocráticos inevitáveis
e escapatórias não me reorientam
seus fins não são opiniosos, mas sim o karma em que me direcionou (eu nem acredito em metafísica)

voláteis dias de abril são inclementes
veja, a sati está morta
sua viúva outorgou a não desistência
os papéis burocráticos foram queimados
iguais a você
a uma realidade estrutural que julgou inclemente
tornando-se passivo a ela na cremação

eu não te culpo
descanse em paz

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Lorraine Ramos Assis (Instagram) é uma artesã do caos. Carioca, nascida no ano de 1996, mais conhecido como o ano do ”fim do grunge”, se atém para o rompimento de nossas zonas de conforto. Contribuiu para as revistas Ruído Manifesto e Diversos Afins, e para as antologias Senhoras Obscenas e Ruínas (ed. Patuá).