OBRAS COPIADAS: RIPLEY SUBTERRÂNEO E DESVARIOS NO BROOKLYN – VERA SAAD

Coluna | Palimpsesto


Qual o limite entre influência, homenagem ou cópia? Minha teoria é de que muitos nos constituem, somos muitos pensamentos, vozes, sonhos, pesadelos. Uma ideia dificilmente é exclusividade minha. Ao ler Desvarios no Brooklyn, de Paul Auster, contudo, não deixei de me perguntar o quanto da escolha da história, muito semelhante à do pintor Derwatt de Patricia Highsmith em Ripley Subterrâneo, foi, ou inconsciente, ou uma homenagem ao Ripley, ou mesmo uma provocação, há obras copiadas dentro e fora do livro.

Nos dois livros, um pintor famoso, que garante o lucro da galeria de arte, morre e passa a ser falsificado. 

Vamos às raspadinhas:

“[…] Foi por volta dessa época que Dryer surgiu com o plano de tirar Harry do enrosco. Chupar e transar tinha lá seus limites, ele sabia disso, mas se pudesse se tornar de fato indispensável, sua carreira como artista estaria salva. Apesar do intelectualismo frio de seu trabalho, Dryer tinha um enorme dom natural como desenhista e colorista. Havia reprimido esses dotes em nome de uma idéia, de uma noção da arte que valorizava o rigor e a exatidão acima de todas as coisas. Ele detestava o romantismo esfuziante de Smith, sua gestualidade floreada, seus impulsos pseudo-heróicos, mas isso não significava que não pudesse imitar o estilo, se assim o quisesse. Por que não continuar criando a obra de Smith depois da morte do artista? As telas e os desenhos finais de um jovem mestre cuja vida fora ceifada em seu auge. […]” Desvario no Brooklyn, Paul Auster.“[…] Tem um americano chamado Thomas Murchison, ele não é marchand, mas é colecionador… aposentado, com grana para chuchu. Ele comprou um Derwatt conosco faz três anos. Comparou o quadro com um Derwatt anterior que acabou de ver nos Estados Unidos e agora está dizendo que é falso. E é, claro, já que foi Bernard quem pintou. Ele escreveu para a Galeria Buckmaster (para mim) dizendo que acha que o quadro que tem não é genuíno, porque a técnica e as cores pertencem a um período de cinco ou seis anos antes na obra de Derwatt. Estou com a forte sensação de que Murchison tem a intenção de criar caso. O que fazer em relação a isso? Você sempre tem boas ideias, Tom. […]” Ripley subterrâneo, Patricia Highsmith.

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Vera Saad é autora dos romances Dança sueca (Patuá, 2019) e Telefone sem fio (Patuá, 2014) e do livro de contos Mind the gap (Patuá, 2011), é jornalista, mestre em Literatura e Crítica Literária pela PUC – SP e doutora em Comunicação e Semiótica também pela PUC – SP. Ministrou no Espaço Revista Cult curso sobre Jornalismo Literário em 2012. Tem participações nas revistas Cult, Língua Portuguesa, Metáfora, Portal Cronópios e revista Zunái. Vencedora do concurso de contos Sesc On-line 1997, avaliado pelo escritor Ignácio de Loyola Brandão, foi finalista, com o romance Estamos todos bem, do VI Prêmio da Jovem Literatura Latino-Americana. Seu romance Dança sueca foi selecionado pela Casa das Rosas para o projeto Tutoria, ministrado pela escritora Veronica Stigger. Mantém uma coluna na revista Vício Velho.