TERRA CAPITAL – ADRIANO ESPÍNDOLA SANTOS

Coluna | Anseios Crípticos


Poucas vezes me senti aturdido numa leitura. Ah – você pode dizer –, mas você não leu o suficiente. Não serei manhoso para relatar o que ou o quanto li. Talvez, tenha lido um pouco para perceber; tenha “passeado por diferentes mundos”. [Não se pode ler tudo, e, por mais que se vomite sapiência, é pouca vida para muita informação]. Eu sou, acima de tudo – antes de leitor –, um curioso. Me encantam histórias que se passam no interior, com uma certa intriga supersticiosa. Sou piegas a ponto de me seduzir com lobisomem e afins? Sim, supostamente, se for bem escrita. Mas… o que dirá de uma santa suicida? Quando li o livro “Nossa Teresa: vida e morte de uma santa suicida”, de Micheliny Verunschk, embrenhei-me na qualidade de ser um espírito vacante, ondulando sobre os caminhos da imaginação – claro, seguindo a trilha do narrador. Grandes elementos ilustram a jornada, como oratório, igreja, poder, alienação. A leitura, ora já escassa, me faz lembrar do sacrifício da menina protagonista, que, mesmo em vida, era uma alma penada, tentando se desligar da terra. É o que acontece a todas as santas e santos? A terra é uma passagem crucial e efêmera? Estou propenso a acreditar nessas nuances – não por tendência à santidade, jamais. Estive mais próximo, nos idos de 2020, da Era da morte, na pandemia – e quantas gerações não passaram por situações piores… E aí me pego a pensar na extraordinária pergunta: o que é a vida? Abujamra e outros filósofos me deixam em choque ao pensar nas possibilidades. A vida, como ele disse, é um projeto falido? Não sou tão pessimista assim. Péssima é a qualidade de vida que se pode viver, pelejar, como num jogo, voltar uma, duas casas, quando se pensa que está quase ganho. A vida é uma premência irrecusável – se assim o quiser. E outro poderia me perguntar: para quê tanta urgência? Ora, urge comer, vestir-se, pagar o colégio privado do(s) filho(s), pagar IPTU e IPVA, pagar, ainda, veja só, um plano de saúde, para melhor morrer. Que mancada é viver num mundo capitalista, convenhamos, você que se diz entendido das coisas. Bastaria viver um tempo na floresta para se aprender o que é socialismo? O homem branco não está disposto a isso; não está disposto, logicamente, a ser um índio selvático, mote para tantos preconceitos. A ganância e o poder requerem o capital. Ser santo ou santa nessa vida é, quiçá, um compromisso com a transcendência e nada mais, para se livrar da mesquinhez dessa terra capital. 

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Adriano Espíndola Santos (Instagram | Facebook) é natural de Fortaleza, Ceará. Em 2018 lançou seu primeiro romance “Flor no caos”, pela Desconcertos Editora; em 2020 os livros de contos, “Contículos de dores refratárias” e “o ano em que tudo começou”; em 2021 o romance “Em mim, a clausura e o motim”, pela Editora Penalux; e em 2022 a coletânea de contos “Não há de quê”, pela Editora Folheando. Colabora mensalmente com as Revistas Mirada, Samizdat e Vício Velho. Tem textos publicados em revistas literárias nacionais e internacionais. É advogado civilista-humanista, desejoso de conseguir evoluir – sempre. Mestre em Direito. Especialista em Escrita Literária e em Revisão de Textos. Membro do Coletivo de Escritoras e Escritores Delirantes. É dor e amor; e o que puder ser para se sentir vivo: o coração inquieto.

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Referências

BERNARDINO, Andressa Lira; AMARAL, Emilly Ferreira. Lições sobre narrativa no romance Nossa Teresa: vida e morte de uma santa suicida, de Micheliny Verunschk. revista ao pé da letra, recife, v. 23, n. 2, jul.-dez. 2021.  

RICCIARDI, Luigi. NOSSA TERESA: VIDA E MORTE DE UMA SANTA SUICIDA – Micheliny Verunschk. Disponível aqui. Acesso em: 24 jan. 2024.