AS LUZES NA RETINA – ADRIANO ESPÍNDOLA SANTOS

Coluna | Anseios Crípticos


 

Posso mesmo me considerar escritor? É, dentre tantas, uma questão existencial, à qual me apego desde 2015. Estava, aí, concluindo o meu mestrado em Portugal, e voltaria à minha terra para exercer a profissão de professor de direito. Não era, contudo, algo tão palpável para mim. Eu escrevia muito: crônicas, contos… para me livrar do fantasma da inação. O que me dava sentido profissionalmente, ainda que muitos não pensem assim, era a escrita. Eu não estava preocupado em ganhar dinheiro. Na verdade, nunca pensei seriamente nisso. Hoje, com um filho, essa demanda é uma necessidade cogente: preciso ganhar o suficiente para dar conforto a ele. E agora, depois de tantos entraves psicológicos, me pergunto se a escrita poderia de alguma forma manter a mim e à minha família. Já não sou mais um garoto, tenho quarenta e dois anos e uma profissão indefinida, incompleta, porque não me provém – sou advogado pelas circunstâncias, mas me dá medo seguir. É simplesmente isso? Devo garantir o que não gosto tão somente para pagar as minhas contas, e no tempo livre tentar dar vazão às minhas ideias. Por que não ser escritor em tempo integral? Estou, agora, me sentindo inútil e cingido aos meus próprios bloqueios. Ontem peguei de novo o livro Diário da Casa Arruinada, de Tiago Feijó. Que escrita cativante e quanta profundidade filosófica há aí. Lendo me perco em propensões do que poderia ser. Escrever é uma atividade de autorrealização. Lendo o Tiago tive essa percepção, de que ele é um homem realizado. Ler, escrever e estudar sobre a literatura é como se brotassem luzes nas retinas, uma possibilidade de enxergar além. O que será que passa na cabeça do Tiago sobre essa profissão de escritor? Fico pensando e elaborando planos para me manter fiel à escrita e, igualmente, arranjar meios para sobreviver. Posso ser professor de literatura. Ano passado, quando me licenciei em Letras-Português, com especialização na área, supus que conseguiria me firmar numa faculdade, para lecionar literatura. Ainda, infelizmente, não surgiu a oportunidade. Há muita gente que o faz com excelência. É fácil perceber pelo que digo: tenho uma síndrome de vira-lata, ou uma sensação renitente de fracasso, que me tira do eixo. Queria, um dia, conversar com o Tiago sobre literatura, sobre trabalhar com isso, sobre a vida; admiro-o, de longe. Mas não sei se ele teria paciência para aplacar os ânimos de um jovem aprendiz. Independente disso, continuo escrevendo, por sina, por necessidade. Espero, até os meus derradeiros dias, continuar escrevendo, ainda que para um deleite pessoal. E que haja, com o tempo, um calor natural que serene os meus impulsos autodestrutivos. Talvez ser escritor seja dor e amor, e o que mais puder para me sentir vivo.

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Adriano Espíndola Santos (Instagram | Facebook) é natural de Fortaleza, Ceará. Em 2018 lançou seu primeiro romance “Flor no caos”, pela Desconcertos Editora; em 2020 os livros de contos, “Contículos de dores refratárias” e “o ano em que tudo começou”; em 2021 o romance “Em mim, a clausura e o motim”, pela Editora Penalux; e em 2022 a coletânea de contos “Não há de quê”, pela Editora Folheando. Colabora mensalmente com as Revistas Mirada, Samizdat e Vício Velho. Tem textos publicados em revistas literárias nacionais e internacionais. É advogado civilista-humanista, desejoso de conseguir evoluir – sempre. Mestre em Direito. Especialista em Escrita Literária e em Revisão de Textos. Membro do Coletivo de Escritoras e Escritores Delirantes. É dor e amor; e o que puder ser para se sentir vivo: o coração inquieto.